terça-feira, 24 de julho de 2012

Projeto Reflexio.....

TOT 9 EJA- ESCOLA GUIA LOPES - CANDELARIA -RS

PERFIL DA TURMA
A turma é composto de 28 alunos, na matrícula original. Durante as aulas neste ano somente uma noite compareceram vinte e dois alunos, nas demais oportunidades sempre menos. Esta dinâmica é uma particularidade da Eja. A totalidade 9, chamada de Tot 9, corresponde ao 3º ano do ensino médio. São alunos trabalhadores que de alguma forma ficaram fora da escola em tempo normal. São atualmente , 12 alunos do sexo masculino e 10 feminino.A matrícula na Eja pode ser feita em qualquer tempo e as turmas estão em constante mudança. Esta dinâmica ainda deixa a Eja mais heterogênea. Temos as diferenças de idade com alunos entre 18 e 32 anos. Muitos afastados da escola de 4 até 14 anos. As causas destes afastamentos são as mais diversas, mas questionados os alunos indicam como principal motivo o casamento, seguido do tipo de trabalho que causa cansaço ou exige tempo noturno, mudança da família para o interior e falta de interesse pela escola. Indagados sobre os motivos para voltar a estudar e buscar a conclusão do Ensino Médio, temos principalmente a intenção de fazer cursos, uma faculdade e melhorar profissionalmente.

 Uma das características da Eja é a heterogeneidade da turma de uma forma bastante evidente. Reconhecemos que nas outras modalidades de ensino esta situação é comum, mas o que acontece no ensino noturno é a evidência, considerando desde a idade até os interesses e condições de aprendizagem. Apresenta-se como mais um desafio para nosso planejamento que deverá ser flexível para incluir alunos diariamente.

Apresentamos num momento especial de diagnóstico comum nesta fase do ano letivo, questões que nos auxiliaram a compor o perfil acima e também investigar o repertório já construído em artes.

“O que é arte?” Esta pergunta foi um dos questionamentos que direcionamos aos alunos. Tivemos respostas importantes que definem: “arte é a maneira como a gente se expressa, é a criatividade, é tudo que é bonito ou as pessoas gostam e admiram, é expressão das culturas, é tudo que criamos, é nossa imaginação, estuda as artes no mundo e nos traz conhecimento”. Algumas respostas mais elaboradas como: “Arte é a forma que cada um tem de ver várias coisas e se expressar, a arte está em tudo, viver é uma arte, um meio de crítica à sociedade.”             

Perguntamos sobre o que sabemos sobre arte e tivemos respostas como: ”a arte é tão intensa que não sabemos explicar, sei de alguns pintores e várias histórias como de Van Gogh, sei que arte é atitude, sei que artes está presente no nosso dia a dia e em todo lugar, sei sobre algumas telas que retratam o passado, sei que mexe muito com a gente.” Um aluno com 18 anos que cursava o ensino médio no turno da manhã respondeu as questões todas de uma forma muito particular: “Sei de artes, o mesmo que sei de mim, do meio em que vivo de quem convive comigo, do que sei de mim, acho que conheço mas sempre me surpreendo”.

Os alunos desta turma na sua totalidade entendem que a arte é importante na escola e fora dela, por razões diversas: “para aprender coisas diferentes, para nos descontrair, para relaxar a mente, interagir com os colegas, para nos expressarmos com liberdade, para desenvolver nossa criatividade, na escola é o único lugar que vou ter para fazer um desenho”. Mais uma vez nosso jovem aluno se expressa de forma diferente dos demais: “a arte pode moldar nossa crítica e gosto, elevar a cultura”.

Sobre sugestões ou expectativas de aprendizagem em artes não houve contribuição nas respostas, duas alunas colocaram a vontade de aprender a pintar.

 Um belo desafio, pois trabalhar com arte, com a sensibilidade numa turma muito dedicada, com alunos atentos mas que em relação à arte teremos de construir e tentar seduzi-los.

 Fayga Ostrower, no seu livro “Universos da Arte”(OSTROWER, 1991),sobre uma experiência de ensino para operários de uma fábrica, faz o seguinte questionamento:


Como colocar-me diante dos operários a discursar sobre valores espirituais quando sabia perfeitamente que, para a maioria, a grande e exaustiva tarefa continuava a ser a sobrevivência material? Não seria descaso de minha parte ignorar ou fingir ignorar isto? Diante de problemas de tamanha urgência, a própria sensibilidade pode parecer um aspecto irrelevante da vida. (OSTROWER, 1991, p.20)
 

Como ensinar artes para alunos trabalhadores sem repertório construído, que percebem o tempo de EJA como uma “passagem” no sentido de concluir o curso? Como significar a arte? Como representar-se como autor? Como trabalhar com a sensibilidade? Como construímos nossa imagem? Quais os recursos e estratégias alguns artista se utilizam para representar-se? Como podemos apreciar algo que não conhecemos?


 PROJETO DE ESTÁGIO

Título do Projeto:

Reflexio




4.2.1 Objetivo geral

 Oportunizar experiências de fruição e compreensão estética inserindo os alunos na arte contemporânea, tendo em vista a discussão sobre a identidade e a construção de auto-retratos percebidos como registro de impressões para a compreensão do mundo.


4.2.2 Objetivos Específicos

 - Oportunizar percepções, resgatar competências e importâncias, sensibilizar olhares, exercitar a contemplação, ampliar repertório na arte;

- Provocar reflexões através de retratos percebendo a imagem como forma de pensar o mundo e a própria arte;

- Propiciar à alunos trabalhadores a oportunidade de se reconhecerem, se revelarem (re)significando suas visões da arte e de si mesmos;

- Propor práticas que possam desenvolver a percepção da dupla função do retrato: a representação visual e o desvelamento interior, reivindicando uma identidade;

- Criar situações onde o aluno da Eja possa ser ouvido, construindo seu discurso, resgatando sua identidade, exercitando a autonomia em busca da igualdade do aluno, da turma, do curso e na sociedade.


4.3 Conteúdos

-Questões de identidade
-Diferentes poéticas de artistas e imagens
-Retratos e auto-retratos
-Arte contemporânea e suas reflexões
-Observação sensível e educação do olhar
-Poética pessoal


4.4 Justificativa

 No contexto de nossas observações e vivências nesta turma, Tot 9, num pensar sobre nossa função como professora mediadora e persistindo na compreensão da arte como área de conhecimento nossa proposta busca essencialmente inserir o aluno da Eja, no universo da arte. Com um perfil de alunos trabalhadores, excluídos do sistema normal de ensino interessados em aprender. São os primeiros alunos da escola na modalidade EJA na tot 9 que tem arte como parte do currículo. Pelas nossas observações entendemos que há um relativo amadurecimento na compreensão da importância da arte em nossas vidas, porém algumas questões com foco especial na criatividade e expressão. Nos sentimos amparadas por alunos que já deslocaram o ideal da área de artes do fazer somente e a pensam como processo. O projeto do semestre inclui o resgate da identidade do aluno, do curso e do ensino. Nosso percurso além deste projeto prevê ações de desvelamento, de reencontro de valorização, e construção de autorias.

 Com a arte temos a oportunidade de propor experiências inéditas, de resgatar momentos que nossos alunos foram impedidos de viver na infância ou juventude, com os fracassos escolares ou as necessidades de sobrevivência. As evidências nas observações nos proporcionam um diagnóstico de pouco acesso à formação e ao desenvolvimento humano. “Necessidade de um olhar mais demorado para sensibilidade e para a criação. Pensando então, um olhar possível sobre o humano e tentando este resgate, recuperar “a humanidade que lhes é roubada em outros tempos e espaços” (Arroyo,2000,p.24).

A escolha do título “Reflexio” para nosso projeto nos remete à origem etimológica latina de dois termos que usamos na nossa língua: reflexo e reflexão. Sintetiza nossa intenção de abordagem, o retrato, a imagem como forma de pensar o mundo e a própria arte, uma reflexão como ato de pensar.

A arte pode conforme DUARTE JR, 2001,



consistir num precioso instrumento para a educação do sensível, levando-nos não apenas a descobrir formas de novas até então inusitadas de sentir e perceber o mundo,como também desenvolvendo e acurando os nossos sentimentos e percepções acerca da realidade vivida. (DUARTE JR, 2001, p.23)



 Oportunizar percepções, resgatar competências e importâncias, sensibilizar olhares, exercitar a contemplação, ampliar repertório e perceber a construção de retratos além da representação, como significação é o que nos move na escolha desta proposta e nesta sequência de ações.

Justificamos nossa escolha propositiva ainda buscando ARROYO, 2000 quando diz: “tentem uma escola onde haja tempos para o sentimento, para os rituais, para a cultura. Para que as crianças e adultos mostram seus rostos, mostram-se gente, mostram-se gente, mostram-se na sua humana essência.”(Arroyo, 2000, p.133).

Retratos e desvelamentos nos remetem a João Guimarães Rosa:



O senhor... mire e veja mais      

Importante e bonito do mundo é isto:

que as pessoas não estão sempre iguais,

não foram terminadas – mas que elas

vão sempre mudando.

É o que a vida me ensinou.

Isso me alegra (...).


4.5 Metodologia

        Percebendo o cenário das aulas de artes inserido no projeto da EJA 2012 de forma interdisciplinar, compreendendo a necessidade de um ambiente acolhedor para este aluno de um universo diferente e particular acreditamos no projeto como forma de organização para nossa intenções. Nossa reflexão constante nos atos de ensinantes e aprendendes nos levam a acreditar no pensamento de Fernando Hernández, “todas as coisas podem ser ensinadas através dos projetos; basta que tenha uma dúvida inicial e que se comece a pesquisar e buscar evidências sobre o assunto”. ( Hernandez, 1998, pg.47)

  Pretendemos, então, instalar percursos com alunos atuantes e um professor mediador, característica do projeto e incorporar o olhar de Ana Mae Barbosa, quando nos instiga a pensar arte além da ação de fazer. Traz-nos uma abordagem triangular quando oportunizarmos um fazer, ver e contextualizar.

Esta dinâmica longe de ser linear nos ampara na idéia de construir redes, de conectar conhecimento do aluno com 32 anos, afastado da escola há 10 anos, ou o universo de um aluno que agora fez 18 anos e participa dos mesmos objetivos. Esta valorização do outro como importância, o amparo teórico, a leitura de imagem, a responsabilidade de um professor propositor além da concepção de que todos podem aprender,  determinam a metodologia desta proposta.

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